Olho Vivo

É difícil entrar no tema da corrupção porque ele desperta, em sua essência, indignação em cada um de nós, além do que, mais ainda, provoca discussões acaloradas que costumam pulverizar amizades, sem alterar as crenças de ninguém. Todavia, o tema é recorrente, como febre microbiana, e se estabeleceu nas primeiras páginas de nossos jornais e nas redes como a grande novidade que não é. Porém, antes de abordá-lo, quero assegurar que não estou aqui atacando ou louvando nenhum partido político ou governo, apenas me situando entre aqueles que abominam a corrupção, repudiam a ladroagem, tanto e de tal forma, que se atrevem a escrever sobre ela.

Não somos nem de longe os mais corruptos nem os maiores corruptores da Terra, entretanto, somos sim, atualmente, um dos países mais atingidos por esse mal. Fruto provável de nossa herança colonial e escravocrata, este desvio de conduta perseverou a tal ponto ao longo dos séculos que acabou criando a cultura institucional de propinas e chantagens, concessões e apaniguados, peculatos e impunidades, irrigando de malandragem o adubo das relações público-privadas. Nada mais óbvio, nada mais inquestionável, quando se consegue identificar, com seriedade e isenção, e não com diletantismo ideológico, qual seria o grande causador da corrupção. Cada um tem a sua opinião. A minha é imediata e clara. O causador da corrupção é a politicagem, pois é ela que tem por objetivo maior atender aos interesses pessoais, trocar favores particulares em benefício próprio.

A politicagem se propaga em praticamente todos os regimes de governo, desde o feudalismo medieval, passando pelo despotismo obscurantista, pelo capitalismo ilimitado ou pelos híbridos econômicos da atualidade. Em todos, as nações politicamente estruturadas, com suas regras particulares, acabam vítimas da lógica da ladroagem, da propina, vassalos dessa perversão que entra pelas engrenagens da máquina doEstado e das empresas como o óleo penetra nos motores. Contudo, o que fazer diante do vício?

Como no caso da violência, a solução se encontra na educação, sobretudo na educação religiosa, que ativa a espiritualidade e diminui o desejo de apenas possuir bens materiais, considerados transitórios. Ricos e pobres nasceram pelados para a vida, entre gritos e sangue, e assimilaram, como esponja, o exemplo que viam diante de seus olhos. A honestidade veio do exemplo e não das palavras.Nem todos os ricos são honestos e nem todos os pobres são desonestos, e vice-versa. Por isso encontramos corrompidos e corruptores em todas as camadas sociais. Por isso, a honestidade é e será sempre uma questão de educação, e mesmo de fé. No universo materialista em que vivemos, a lógica tende a ser corrupta, impondo a dominação do capital sobre os demais valores da existência. A riqueza material impõe-se à riqueza espiritual, estimulando a exploração do trabalho, a devastação da natureza e a perversão dos valores morais. E, entre grupos econômicos dominantes e cartéis de todos os formatos e nacionalidades, o homem sem estrutura moral e espiritual se deixa invadir por este caldo sujo, como o óleo de motor, que ao lubrifica-lo de início, acabará lambuzando-o mais tarde, inevitavelmente.

Para combater a corrupção, além da educação, precisamos de transparência, e isso significa mais policiais e magistrados honestos, além de auditores. Muitos auditores. Muitos mesmo para clarear a escuridão do crime e estimular, cada vez mais, o processo democrático no Brasil. A participação crescente da população, de todas as classes sociais, nos assuntos de Estado trará essa transparência que precisamos, não apenas para combater os corruptos nacionais, e prendê-los, porém, também, para evitar que os corruptos de fora venham a tomar o lugar destes. Porquanto, não duvidem: os grandes corruptores do Hemisfério Norte, das sociedades mais industrializadas que a nossa, estão às gargalhadas de felicidade diante das denúncias que ocorrem, atualmente, na Petrobrás. Afinal, suas companhias petrolíferas reconhecem, apavoradas, que o petróleo no Oriente Médio e do Mar do Norte está escasseando, assim como sabem dos riscos ambientais de se perfurarem poços de petróleo no gelo da Groelândia. Para eles, o nosso Pré-sal é um botim e tanto. O botim dos deuses. O próximo botim. E, eles virão com tudo, para cima de nós, por ele. Por isso, concluo com este simples alerta: – Olho vivo, minha gente…

(Raul de Taunay, Brasília, 15 de dezembro de 2014)

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