Múltiplos fascínios

 

“À sombra da varanda, silenciosos e atentos, aspiramos no mais profundo de nossas mentes, por um breve momento de arte para descrever com clareza e fino senso as páginas esplêndidas que a natureza descortina para nós a todo instante; as dores destes tempos passarão e o essencial se enraizará: o alento humanista, o verso sublime, a risada matinal; devemos compreender que a vida é melhor se não tiver qualquer significado e que a originalidade não é saber o que escrever e sim sentir o que jamais se escreverá.

O sol rasga distâncias para nos aquecer; aproveitemos.

Chocolates, vinhos, cervejas… Imponências, casarões, palácios … Igrejas, escolas, museus… Tradição, atmosfera, charme… se pensarmos bem, no Brasil, quase todas as regiões  transpiram um ambiente augusto de clima, urbe e natureza, lado a lado, como se fosse um paraíso finíssimo, inebriado de inalterável serenidade; mesmo a caatinga esfomeada tem suas cores, seu desenho configurado, sua estampa; e se onde estivermos fosse pior do que a gruta de pescadores, ouçamos as harpas do coração e figuremos um local de fascínios múltiplos, onde a pureza dos costumes, a abundância dos contornos e ângulos, e a elegância da pedra nos embevecerá como a um artista que se inspira do seu próprio talento em criar a sua realidade, o seu momento de encantamento, com os requintes de quem se figura em plena Versailles; e com esses arroubos de entusiasmo, nos elevamos a um ponto em que começamos a questionar de onde vem, em nossas vidas, o sentido de aventura, a sedução pelo desejo de conquista, o inconformismo, a necessidade pura e simples do deslocamento, a exploração pela ganância, a curiosidade científica, a necessidade de se descobrir o caráter inexorável da natureza; os viajantes sempre descobrem um motivo para embrenhar-se pelo desconhecido, de abrir território, de atravessar dificuldades em nome da honra e da glória, de cair e sair do abismo selvagem em que se enfurnaram na busca do reconhecimento ou do conhecimento; por outro lado, o explorador não deixa de ser um herói, um sonhador, um idealista que se extravia e se arrasta através de um destino iniludível, onde prevalecem as trevas ou as luzes do que costuma ser um relato romanesco próprio de cavalaria em sua imaginação.”

 

– Trecho de “Nós” (Fragmentos filosóficos de tempos incertos), do escritor Raul de Taunay.

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