“Dediquei centenas de versos a elas e, certamente, me irei desta vida escrevendo alguma coisa em louvor a elas pois, mais do que qualquer outro ser, eu as amo, as respeito, as protejo quando me é dada a oportunidade; são rainhas e mães, e merecem nossa devoção, nossa paixão, nosso agradecimento pelo muito que fizeram pela civilização; acho mesmo que aquele que ama apenas uma mulher está inclinado a saber mais sobre elas do que aquele que tem dezenas delas mas não conhece a nenhuma. As mulheres devem ser amadas e não colecionadas; o homem não deve temer enfrentar o perigo e a aventura que significam essa entrega a apenas uma pois, nela, ele encontrará uma e todas, como se o seu coração dela fosse toda uma orquestra de instrumentos musicais, e eu sou sincero ao dedilhar neles a melodia que me embala, assim como sou sincero ao dizer que a mulher que se dedica em evidenciar apenas a sua beleza proclama aos outros que não tem qualquer outro atributo, o que não deixa de ser decepcionante; a beleza tem que ter alma, inteligência, perspicácia, lume, para romper com os preconceitos e as mentalidades retrógradas; lembremo-nos de que, antigamente, se dizia que o melhor emprego de uma mulher era um bom casamento; minha avó mesmo afirmava com toda ênfase que a sorte da mulher dependia do amor que ela aceitava; assim, pois, rompendo essas convenções, eu concluo que mil mulheres podem erguer um acampamento, mas basta uma mulher para edificar um lar; estou do lado dela e de todas, as casadeiras ou as solitárias, as que gostam de ser mãe ou as que preferem criar cães, pois frente a elas a minha vocação não seria raciocinar, seria sentir – e o que sinto e sempre senti por elas é combustão eterna; e sendo hoje marido, vigora para mim a rígida moral da subalternalidade no matrimônio: eu aparento mandar, ela simula obedecer; e, em meio aos malabarismos da vida conjugal moderna, a higienização de hábitos e valores me rende a cada vez mais admirador desta mulher moderna, reinventada, que rompe todo um ciclo milenar de subordinação e dependência.”
– Trecho de “Nós” (Fragmentos filosóficos de tempos incertos), do escritor Raul de Taunay.