Não será uma incumbência simples levar aos leitores minha coletânea de poemas, tendo em vista estar eu ainda vivo e saudável, e haver eu escrito meus primeiros versos aos 8 anos de idade. Imagino, inclusive, que deverei, em primeiro lugar, encontrar e reconhecer as peças mais figurativas sem me enredar na hesitação de escolher uma antologia de poemas representativa ou qualitativa. Todavia, cuidarei de não incorrer no encalhe de pinçar a minha seleção com a lente crítica, pois pretendo reunir uma seleção que seja sobretudo instintiva, fruto de meu tempo, de meu ânimo, de meus anseios e temas – sem esquecer jamais que a arte poética é, em geral, um conjunto de regras com a finalidade de produzir beleza.
Talvez assim consiga aproximar-me das gerações atuais, que cresceram numa realidade distinta, marcada pela informática e pelas redes sociais, demonstrando-lhes que existe fascínio em alguém de minha geração. E, para tal, nas produções escolhidas, abrirei caminhos para a descoberta do poeta que me tornei: um personagem simples, nascido em Paris, mas brasileiro nato desde o primeiro respiro, que viveu grande parte da vida pelo mundo afora e que escolheu o Brasil para sede de sua recente operosidade. Um poeta que perseguiu na limpidez do estilo a singeleza de uma linguagem que o levou a amar as coisas da vida sem afetação e a afeiçoar-se às criaturas sinceras que conheceu pelo mundo afora; ou melhor, um artesão das formas, um diplomata experimentado na complexidade das relações entre países, um poeta que sonhou muito, e sofreu, e divagou e se perdeu em amores e reencontros com as estâncias e as rimas que tanto o inspiraram.
Assim, o retrato que esta obra tentará deixar de mim quando estiver pronta é do homem independente que sou, de personalidade romântica, distante de modelos e sistemas, cultor desartificioso da liberdade de estilo, do m’enfoutismo lírico que me levou a escrever por impulso poemas, romances, contos, elegias, baladas, trovas, sonetos e outros, tocado pelo desejo indecifrável de partilhar emoções, criar imagens e ritmos, contar segredos e degredos, num ato de devoção aos cantos eternos e universais sustentados no amor, nas alegrias, nas tristezas, na glória de sentir-se um autor.Haverá nesta seleção um universo estranho e belo, anseio eu, evolando o cheiro das flores, o gorjeio dos pássaros, o rumor das folhas, os cascateios da mente, os voos, as angústias, as interrogações e desencantos que integram o feitiço da arte poética. Com a consciência da fugacidade do tempo, esta coletânea oferecerá, se publicada for, a mais autêntica expressão do encadeamento entre o que fui e o que sou no universo da poesia. Há luas em todos os céus.
O meu luar é o inverso de meu nome: a alma de flores, a solitude nebulenta, os sonhos sempre revoltos.Em breve, a minha “arte poética” será editada para comemorar o eco de toda esta vida que consegui compilar. Será como uma concha a guardar pelos ares a voz do mar.
(Raul de Taunay, Brasília, 9 de maio de 2023)