A Dizer em 2015

Tanto a dizer e, no entanto, a cabeça custa a conceber que já estamos mesmo em 2015. O que foi este ano que passou? Nem sei ao certo, pois, enfim, parece ter sido algo que fluiu para dentro do registro da história como um maço de expedientes ao qual se dá um traço de arquivo, se apõe uma rubrica, e nunca mais o vemos, como se em nenhum momento tivéssemos lido, analisado e resolvido suas pendências e questões. Classificam-se como contribuições descartadas pelo relógio implacável do tempo, que nos levou ontem ao clima dos abraços, saudações e votos de felicidades, entre brindes, exclamações, beijos e fogos de artifício. Passaram a ser, no fundo, páginas viradas do calendário de 2014, de cujo último momento retiro a lembrança de que necessitarei fazer um primeiro gasto em 2015: comprar uma nova agenda e preencher dados, códigos e números de telefones, tudo de novo, numa espécie de revisão, ou melhor, inspeção de turbinas individualizadas. A garotada diria para eu registrar tudo no tablet ou celular. Impossível para mim. Além deles, preciso a certeza do registro no papel – é, gente boa, sou mesmo um dinossauro… – todavia, como nenhum meteoro apareceu nos radares da Terra para me extinguir, vou confirmar que o tempo e o vento passaram e sopraram nestes últimos doze meses sem realmente ter-me surpreendido com algo de novo, de verdadeiramente novo para mim, apesar de nossa vergonhosa derrota futebolística, de nossa gloriosa epopéia nas ondas do surfe, da inconcebível queda do meu Fogão para a Segunda Divisão, ou a realização de eleições presidenciais que nos trouxeram, pela vontade da maioria dos eleitores, um pouco do que justamente estou procurando justificar: a continuidade do que se me afigura neste momento o direito de perambular pelo nada.

Para mim, 2015 deverá ser uma extensão de 2014, assim como o ano findo que, sem mal ter começado, me pareceu uma repetição de 2013, principalmente, porque tão pouco me recordo dele. Será que esta sonolência com relação à efeméride, ao calendário, ao sistema de divisão do tempo seja apenas a preguiça de despertar com a ressaca da véspera e a morosidade de encarar a tarefa de virar a última folhinha de 2014? A última folhinha… e pronto. Acabou-se o que era doce. Vamos a 2015. O dia está cheio de suspense e obrigações, a começar pela posse presidencial que agitará a Esplanada e, certamente, trará alguns sustos, calafrios e cabelos brancos aos servidores do cerimonial e das forças de segurança. No mais, serei eu a mostrar meus “alguns” cabelos brancos ao envergar amanhã terno e gravata para cumprir um dever. Assistirei com enorme prazer a posse de meu colega, amigo e contemporâneo no Instituto Rio Branco, embaixador Mauro Vieira. Quem me conhece sabe que não sou de bajular e que, se minha carreira não foi meteórica, deveu-se, justamente, ao fato de que não me sinto confortável em dizer ou fazer o que não quero, ou julgo certo, apenas para agradar ou tirar vantagens. Porém, neste caso, e apesar do que possam dizer de mim, não tenho qualquer hesitação em dizer que, neste momento, em que o Itamaraty figura em baixa, a escolha de Mauro Vieira para cuidar da estratégia de nossa política externa foi uma das boas novidades que nos trouxe o ano findo, ou o ano novo. No apagão da memória “pós-reveillón”, naqueles minutos que sobram para deambular espiritualmente aos lençois da cama, numa divagação sem rumo pelo umbral que se forma entre o ano que passou e o ano que se insinua, aqui me junto a vocês sem nada de verdadeiramente novo a dizer, apenas, sim, todavia, com uma expectativa de fé, contar-lhes que gostaria de partilhar os espaços da rede com a minha esperança de que todos sejamos muito felizes em 2015, na perspectiva de cura para nossos males, de amor renovado entre os humanos e com espírito de solidariedade, firmeza e força com que deveremos nos levantar do conforto de nossas camas para encarar o primeiro dia de uma nova era – velha também? – perdida entre os milhões de anos que vão e vem infinitamente pelo espaço que nos abriga. No transcorrer dos séculos de silêncio e trevas das cavernas aos séculos que virão agitados por alicerces da modernidade virtual, homens e mulheres como nós, em todos os períodos, se depararam e se depararão com a mesma solene e magna reflexão na manhã do primeiro dia do ano: “putz, passou rápido demais”.

Boas entradas a todos…

(Raul de Taunay, Brasília, 1 de janeiro de 2015)

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