Domingo é o dia das mulheres. Aliás, todos os dias deveriam ser delas, exclusivamente dessas mães, esposas, filhas, irmãs, sobrinhas, enteadas, cunhadas, namoradas, amigas, e outras tantas representantes deste sexo frágil que, de frágil, hoje resta pouca coisa, havendo elas nestes últimos tempos avançado muito mais que os homens, ultrapassando espaços sequer imaginados por nossas avós ou bisavós, galgando os degraus das longas escadarias do tempo com inteligência e destemor. Sou suspeito por falar delas pois, quem me conhece, sabe o quanto prefiro elas a eles. Sob a égide dos meus sentimentos, as mulheres sempre pintaram e bordaram com as palpitações de meu peito em processo de constante restauração. Sendo hoje marido, vigora para mim a rígida moral da subalternalidade no matrimônio: eu aparento mandar, ela simula obedecer; e, em meio aos malabarismos da vida conjugal moderna, uma higienização de hábitos e valores me rende a cada vez mais admirador desta reinvenção da mulher que rompe todo um ciclo milenar de subordinação e dependência.
Hoje é o dia delas pois acordei pensando em minha mãe, escovei os dentes imaginando o passeio que farei com minha mulher, calcei o tênis antecipando o trajeto que percorrerei pelo parque da cidade, se não chover, com minha filhenteada e minha sogra, e já vou por aqui adivinhando para onde serei levado a almoçar. Brasília apresenta hoje dezenas de boas opções, todavia prefiro deixar a responsabilidade da escolha para elas que, além de escolher bem, costumam, quando se sentem mais soltas, perfumar o meu dia com mais atenções, mais casos, mais demonstrações de carinho e respeito. Sim, porque, nessa equação, o respeito é natural, espontâneo e recíproco, nunca imposto no berro. Se respeito traz felicidade, educação também o faz, pois evita atritos e nos deixa em paz com nossas consciências, sobretudo nos momentos em que as mulheres sofrem seus ataques de nervos.
Há que entende-las nesses momentos. Meu avô sempre dizia que os homens sofrem do coração, as mulheres sofrem dos nervos. O homem que responde aos faniquitos dela com faniquitos seus vai pelo mau caminho ou é, no mínimo, destemperado e mesmo, ousaria dizer, pouco viril. O homem que é homem acha até graça, julga charmoso, e procura desvendar o enigma dos chiliques femininos sem se azucrinar, na boa, curtindo as intempéries misteriosas da alma da companheira, evitando desmanchar o encanto, quebrar o cristal, ou desfazer o nó dos laços sentimentais. Afinal, nada é mais belo e envolvente do que a fertilidade que povoa o universo escaldante de uma mulher em sua crise periódica. Além disso, a evolução dos costumes sociais com o aumento da urbanização gerou a infiltração delas, inteirinhas da Silva, nas engrenagens das transformações, dando espaço ao surgimento de rebeldes e literatas, de atletas e executivas, de autônomas e libertárias, com tanta obra a realizar pelo bem comum que eu nem ouso me intrometer nessa odisséia. Fico só torcendo para que tudo se concretize para elas.
Aprofundando a inevitável socialização das relações de trabalho, onde o exercício dos papéis é hoje quase pau a pau, em igualdade de condições, num horizonte mais equilibrado, a verdade é que, graças a Deus, as mulheres continuam a aparecer e a nos encantar não apenas com o garbo de suas inteligências, mas com a espuma cremosa e eterna de suas belezas e glamour, com o encanto floral de suas personalidades, com a eterna juventude de seu universo cheiroso, gostoso, dengoso e vibrante.
O espaço, para além da estratosfera, deveria ser feminino também, assim como o voo dos poetas orbitando a glória e o prazer do aconchego da mulher amada. Ao refletir até que ponto eu louvo e amo o que as mulher representam, transporto-me para um lugar em que nunca estive, mas que conheço tão bem em minha mente: a fábrica de tecidos em Bangu, zona norte do Rio, lá pelos anos quarenta, imortalizada por Noel Rosa no samba “Três Apitos”. Eu também, sempre em mim, enquanto ela “faz pano, faço junto ao piano, estes versos para você”: mulher de ontem, de hoje e de amanhã; mulher Maria, mãe de Deus; mulher Maria, minha mãe; mulher Maria, minha mulher; e todas as Marias e demais mulheres que fecundam este planeta com seu amor surpreendente,
Deus saberá sempre amá-las e protegê-las, eu também…
(Raul de Taunay, Brasília, 8 de fevereiro de 2015)