O Dia de Ação de Graças (“thanksgiving”) que se celebra nos EUA nesta data me trouxe a reflexão de que os Estados Unidos se tornaram e são hoje, sem favor algum, a grande potência dominante no mundo graças não apenas às características de seu sistema político-econômico, sua supremacia militar, mas, sobretudo, à ousadia de seu povo. Herdando o gene britânico do arrojo, da determinação – responsáveis pela montagem do Império Britânico – o norte-americano teve o estímulo de converter seus sonhos em realidade e de granjear para si o lugar mais proeminente no concerto das nações. Mérito deles, incontestável, embora esse fato não significa que o nosso Brasil, gigantesco por natureza, pela geografia e pelas vizinhanças, não mereça também um lugar de destaque nesse próprio concerto. Não merecemos um papel apagado e nem nos conformaremos a ele, pois, como os americanos, também temos a chispa que os levou a dominar o mundo. É retrógrada a visão de que o brasileiro se satisfaz em ser apenas um povo excêntrico, do carnaval e futebol, sem a menor relevância nos arranjos globais contemporâneos. Não apenas é retrógrada, mas constitui erro crasso de avaliação e estratégia. Não somos irrelevantes, nem subalternos e nem conformados. Somos mais de 200 milhões e queremos nosso lugar ao sol, nosso crescimento, o crescimento de nossos filhos, nossa plena integração ao sistema compartilhado pelas lideranças internacionais contemporâneas.
Há muitas explicações para o fato de que vários brasileiros ainda acreditem na noção imposta pelos analistas de fora de que o nosso universo é dividido entre mocinhos e bandidos, os mocinhos sendo os “cowboys” e os bandidos os índios, ou seja, o resto da humanidade que deseja evoluir. Todavia, inexplicável é o fato de que muitos desses brasileiros parecem sinceramente torcer para que, dentro dessa lógica, as coisas não mudem e o Brasil se mantenha “onde lhe é devido”, ou seja, no escalão inferior. Isso me faz duvidar se eles são mesmo brasileiros, se têm amor ao seu país, pois, além de desinformados sobre os avanços brasileiros nos últimos 40 anos, eles sinceramente torcem pelos bravos “cowboys” e não pela brava gente brasileira. Seu discurso é como uma mandinga contra o crescimento de nossas cidades,de nosso parque industrial, de nossa infraestrutura, de nossa rede financeira e de abastecimento. Mesmo se o mundo inteiroidentificaprogresso e acúmulo de capital em mãos brasileiras, eles buscam avidamente argumentos e notícias que desqualifiquem os nossos esforços pelo desenvolvimento. Seriam mesmo brasileiros? Sendo o que forem, o fato é que não compreendem, ou aceitam, que a gente brasileira, emboraseja simples, humilde e pacífica, é esperta, inteligente, empreendedora e boa de negócios – e, que, sem dúvida, começa a expandir seu horizonte de atuação, apesar da torcida deles em contra.
Ninguém admira mais do que eu as benesses e a ousadia do universo anglo-saxão. Morei na Inglaterra e na África do Sul nos anos sessenta, vivi e passei inúmeras vezes pelos Estados Unidos, adoro as coisas boas de lá, respeito e aprecio o tanto que os americanos fizeram pelo processo civilizatório contemporâneo. Por essa razão, alvitro o mesmo destino para o Brasil. Não devemos nos conformar a um papel secundário, não devemos acreditar no “assim deve ser”, que limita nossa grandeza. Estou convencido, por tudo o que sei e sou, como esponja que absorveu cosmopolitismo a vida inteira, que agora é o nosso momento de ousar, como o fizeram os ingleses e os americanos no passado. Nada a ver com política interna, PT contra PSDB, luta contra a corrupção (que deve prosseguir) ou o papel do Estado e das empresas nestes tempos de mudanças, mas sim tudo a ver com o condicionamento mental que deveriam ter os verdadeiros brasileiros. Não desejamos mais um coadjuvante secundário, subalterno. Mesmo se os “masters” do mundo não gostarem, problema deles; nós aspiramos hoje a edificação de uma área de influência nossa. Não nos conformamos mais com a tese abraçada por alguns desses ”homens sem pátria” de que cada macaco deveria ficar em seu galho.
Não será assim. Está escrito nas estrelas e ficará escrito nos livros de história de que não somos mais o pequeno sagui ou a preguiça estendida numa rama baixa da floresta, Somos hoje um imenso guariba, o macaco gigante,inconformado e inquieto, exaltado e esfomeado, que descobriu o caminho da praça da alimentação, e que vai buscar o que acha que é dele. Essa é a realidade. Somos a sucuri imensa que quer jantar as anacondas de Hollywood; somos um formigueiro colossal e desmesurado de formigões tocandiras, carnívoras e resistentes, com presas de ferro, que emergiu das galerias subterrâneas e partiu para a conquista de espaços novos no tabuleiro das especiarias. Somos o carcará valente e tinhoso que disputa hoje os bezerrosda pradaria comas águias e os gaviões. Economicamente, somos um imenso mercado que começou a dar certo, que se agigantou para atender aos seus milhões de consumidores. Somos, portanto, empreendedores jovens, famintos, cheios de gás, e queremos ficar ricos, fortes e poderosos como os anglo-americanos – o que aliás já está ocorrendo, basta circular pelas cidades do interior brasileiro para ver. Ainda nos faltao poderio militare um conhecimento tecnológico de ponta, porém, ambos virão com o tempo, não duvidem. O importante é acreditar.
De tudo, lamento muitíssimo esse sentimento quase místico de realização que se apodera ainda desses poucos brasileiros quando encontram textos e trabalhos de estrangeiros que desclassificama nossa atualidade e as nossas aspirações. Não há vergonha em ser nacionalista. Os ingleses e os americanos, que eles tanto admiram, são o que há de mais nacionalistas e patriotas. Portanto, para mim, não importa se os brasileiros são modestos, ignorantes, imigrantes ou seja lá o que forem, nem importa se são da direita, do centro ou da esquerda, ou se favorecem ou não o atual governo eleito. O que verdadeiramente interessa é que devemos ser nacionalistas e patriotas;devemos sim, ter garra e ambição, assim como os ingleses e os americanos. Eles dominaram o mundo porque ousaram, ousaram muito em nome de sua pátria, de sua bandeira, de seu nacionalismo. Façamos o mesmo que eles. Sejamos cidadãos nacionalistas, patriotas ebrasileiros; e ousemos, ousemos sempre. Simples assim…
(Raul de Taunay, Brasília, 25 de novembro de 2014)