“Muitos de nós pensam nos outros e buscam melhorar o quadro global do presente contexto, que indica que a riqueza de 1% da população mundial supera a dos 99% restantes dos habitantes do planeta; naturalmente, é tão gritante o fosso entre a minoria riquíssima dos homens e mulheres e a maioria paupérrima que dá vontade de entrar na arena de combate no intuito de matar ou morrer pela causa da justiça; impossível não sentir nada diante desta disparidade gritante; uns poucos não tem mais onde guardar dinheiro, nem saberiam por onde acumular o saldo constantemente crescente de lucros gigantescos que o modelo econômico atual lhes garante, como numa bola de neve que rola para cima apenas para eles, enquanto que a maioria da humanidade, bilhões de pessoas, patinam na insegurança de dívidas, saldos negativos e, porque não dizer, rastejam na miséria, no abandono, no desconsolo e na fome; a desigualdade é tão brutal que autores de vários estudos sugerem, como primeira medida, o fim dos paraísos fiscais que alimentam essas desigualdades; segundo eles, como poderá a raça humana evoluir para um estágio de sociedade mais equilibrada e distributiva se persistirem imutáveis e inalteradas as atuais regras do jogo? Com isso em mente, há que se pensar nos foros de Davos e de Porto Alegre – percepções antagônicas de uma mesma realidade planetária – cabendo a nós perguntar se jamais alcançaremos um padrão ideal de sociedade; afinal, por mais que se estudem os problemas ou se declarem intenções para resolver as injustiças, os que muito juntaram ou herdaram não abrem mão de suas avassaladoras forças financeiras e os que nada tem e que pouco conseguem evoluir no mercado cada vez mais monopolizado, são mentalmente mantidos dentro de um processo de lavagem cerebral constante e repetitivo orquestrado pela mídia dominante, não se tratando aqui de apontar culpados ou pregar revoluções, mas de recordar que essa é uma realidade triste, que fere princípios morais e que, por conseguinte, merece nossa avaliação, nossa preocupação, nosso carinho e humanidade; seria digno simplesmente fingir que o problema não existe? Existe sim, e é gravíssimo.”
– Trecho de “Nós” (Fragmentos filosóficos de tempos incertos), do escritor Raul de Taunay.